Eleições autárquicas: IV – a grandeza dos eleitos locais
Ser eleito autarca é o maior prémio da democracia representativa. É, no momento do voto, ser percebido como capaz de representar o povo real e de resolver ou ser capaz de contribuir para a solução de problemas concretos. É ter a certeza de que, no momento do voto seguinte, em caso de recandidatura, a votação vai funcionar como avaliação permitindo uma reflexão sobre os êxitos e os fracassos.
Fui autarca durante 24 anos, dos pequeninos, membro da Assembleia Municipal de Bragança. Isso permitiu-me confrontar a minha formação teórica em Sociologia Organizacional e em Sociologia Política com a prática real dos autarcas.
Admirei sobretudo os presidentes de junta de freguesia ou de uniões de freguesia que apreciei como um saber político imenso, um saber esperar de gato e de cobra, uma coragem de empreendimento inabalável e uma paciência de santo perante as adversidades geradas pelo centralismo e manigância política dos poderes camarários.
Admirei a seguir os presidentes de câmara municipal e também alguns dos seus vereadores. Nos presidentes pude ver a sagacidade no olhar o futuro, a capacidade para perceber as necessidades concelhias, a destreza em mentir parecendo dizer a verdade, a arte de argumentar perante as invectivas adversárias, a coragem de enfrentar o Poder Central como fez Luís Mina ao exigir uma audiência a um Secretário de Estado atirando-lhe à cara que este não representava qualquer Povo, apenas quem o nomeou, e ele, Mina, estava ali em nome de todos os habitantes do Concelho de Bragança.
Apreciei muitos vereadores, uns pela sua fidelidade ao Presidente e Partido, outros pela sua real inteligência, capacidades de trabalho e de organização.
Apreciei muitos deputados e muitas deputadas municipais. A Assembleia Municipal de Bragança, até final de 2013, tinha 50 deputados municipais, tantos quantos o número das 49 freguesias, mais um (nunca compreendi o porquê deste mais uma). Agora tem 10 freguesias agrupadas já só tendo portanto 79 membros, muitos dos quais, reconheça-se, apenas fazem lá figura de corpo presente. Se ao menos aprendessem a ser democratas, disse-me um colega francês, encantado com o modelo autárquico português.
Há um elemento, porém, que sempre me entristeceu: a escassa participação de mulheres na vida política autárquica e, ao contrário do que seria natural, nem sequer a participação das mulheres tem aumentado, tendo diminuído mesmo de 2017 para 2021.
Com efeito, as «Mulheres representam 21% das candidaturas aos 20 municípios mais populosos do país. Há quatro anos, em 1571 candidaturas a nível nacional, apenas 293 eram encabeçadas por mulheres. Ou seja, 18,6% (…)». (…). A Lei da Paridade estabelece, desde 2019, que as listas de candidaturas aos órgãos electivos para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu e para as autarquias locais devem assegurar uma representação mínima de 40% de cada um dos sexos, não podendo “ser colocados mais de dois candidatos do mesmo sexo, consecutivamente, na ordenação da lista”. Caso contrário, a lista não é admitida.». (https://www.publico.pt/2025/08/18/politica/noticia/mulheres-representam…). Porquê? Gostava de saber, mais imagino.
Por isso, é de saudar a candidatura de Isabel Ferreira a Presidente da Câmara Municipal de Bragança. Ela, as suas capacidades, e as outras candidatas a Presidente, representam uma lança contra o conservadorismo de género nas autarquias locais.